“Qualquer pessoa que se recuse a assumir
a responsabilidade coletiva pelo mundo não deveria ter crianças,
e é preciso proibi-la de tomar parte em sua educação.” (Hannad Arendt)
Hannad Arendt, filosofa alemã, em seu artigo “A crise da educação”, afirmava que ter responsabilidade pelo mundo assume, na contemporaneidade, a forma de autoridade, fato este que deve ser reconhecido para muito além da qualificação ou da capacitação. Talvez esta seja uma das explicações para o atual estado da educação pública brasileira – ausência de autoridade legítima ou total falência da responsabilidade coletiva sobre o ato de educar as novas gerações. E é interessante relacionar este pensamento ao fato histórico da convocação da Conferência Nacional de Educação – Conae, que tem como tarefa central a construção do sistema nacional integrado, além de debater o novo Plano Nacional de Educação – PNE.
O objetivo proposto pela Conae não é nenhuma novidade, pois esta tem sido a pauta principal do movimento progressista em educação no Brasil. É possível identificar na história ressente da República a legitimação de interesses privados em detrimento do bem público, e lógico, que a educação pública também esteve permeada por este enfoque.
Há no sistema educacional brasileiro uma forte contradição. A escola de massas que se consolidou nas últimas décadas permanece distante da formação necessária que o próprio sistema capitalista coloca como condição essencial à formação do homem ativo, produtivo e integrado. Neste sentido, nos ofereceram duas alternativas para elegermos um culpado para o fracasso da educação brasileira. O primeiro trata de responsabilizar a escola, pois diz-se que esta encontra-se despreparada para educar, instruir e profissionalizar. De outro lado, a própria escola trata de culpar a sociedade por esta ter se desresponsabilizado pela educação de seus filhos, ou ainda, de forma mais imediatista, trata de eleger o aluno como desinteressado, incapaz e problemático.
Em meio a tudo isso a questão da autoridade surge como um alerta social capaz de enfrentar esta falsa contradição. A escola tem sido o primeiro canal de relação da criança com o mundo. No entanto, a escola não é, de modo algum, o mundo e jamais deverá sê-lo. Assumir autoridade é um primeiro passo para esse resgate. Como dizia Arendt, “quanto mais radical se torna a desconfiança face à autoridade na esfera pública, mais aumenta, naturalmente, a probabilidade de que a esfera privada não permaneça incólume.” Portanto, é preciso resgatar a autoridade pública frente aos desafios de educar uma nação. Não nos será permitido relegar somente à escola o papel de educar nossos filhos. Para tanto, o Estado (não o governo) deve assumir para si o resgate da autoridade e, assim, ser capaz de responsabilizar também a sociedade para tal.
É nisto que se fundamenta a necessária ação articulada do campo progressista na Conferência Nacional de Educação. Precisamos restabelecer os atores e apontar os papéis corretos para que a educação pública assuma a sua real tarefa, pois é nela que reside “o ponto em que decidimos se amamos o mundo o bastante para assumirmos a responsabilidade por ele”. (Arendt)
Responsabilizar-se é, neste sentido, delegarmos com clareza o papel do Estado, da sociedade e da escola frente à educação e aprendizagem. E isso não será feito se o palco propício para isto se tornar objeto de disputas corporativas incapazes de identificar o centro do embate: a ampliação da educação e a sua tarefa pública frente aos interesses privados e fragmentados que permeiam esta discussão, resgatando o citivas mundi, onde a educação assuma a formação do sujeito “mundanizado”, ativo, liberado de vínculos e ordens e crítico frente aos desafios de seu tempo.
Márcio Cabral, estudante de Pedagogia da UNIFESP, membro da Executiva Nacional da UJS e da coordenação do movimento Da Unidade Vai Nascer a Novidade
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